Nós devotos, sacerdotes e sacerdotisas dos cultos de matrizes africanas, sentimos a obrigação de nos manifestarmos sobre um vídeo de cunho político partidário que correu ontem pela internet.
No vídeo, nossas práticas religiosas foram citadas como fazendo parte de um grande pacto realizado com um culto satanista, para a eleição de um presidente.
O resultado de declarações como essa coloca ainda mais os Povos Tradicionais de Terreiro na mira de pessoas intolerantes, fomenta a desagregação da sociedade através do medo, além de colocar em risco a luta internacional por diálogo e cooperação inter-religiosa
Respeitamos a liberdade de culto, mas repudiamos qualquer atitude que se assemelhe àquelas que fomentam a intolerância, a discórdia e a dissensão social.
Durante mais de 2 séculos, nossos cultos ligados a Orixás, nkisi, voduns e entidades, lutam para combater a pecha dada a nós de sermos cultuadores de diabo, satanás ou demônios. Reforçamos, mais uma vez, que nossas religiões não cultuam tais personagens e não possuem qualquer entidade ou deidade que tenha, nem mesmo correspondência com as tais.
Julgamos que esse seja um momento muito delicado para nossa nação, porém, nem mesmo por desespero justificaria nos incluirmos em algo, que para nós tem gerado tamanha perseguição.
Nossas tradições religiosas, em diálogo, concordam que papel social da religião é apoiar a sociedade a transcender as suas diferenças. Portanto, nos reunirmos pela defesa do bem comum, contribuímos decisivamente, através de nossas práticas e nossas éticas, para que cada pessoa possa superar suas tendências egoístas, violentas e intolerantes e, acessar as capacidades de amar, respeitar e conviver em harmonia com o que é diferente.
Dentro desses princípios, devemos inspirar a humanidade a deixar para trás todo discurso de ódio que divida a sociedade entre “nós” e “eles” e fomentar a criação de um espaço em que toda pessoa possa, em pé de igualdade, contribuir para o avanço de todos.